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terça-feira, 12 de abril de 2016

Tour pela França - Beaune

Beaune
Se Dijon é a capital administrativa da Bourgogne, Beaune pode ser considerada a capital afetiva da região. Essa pequena cidade encravada em meio a vinhedos multicentenários é uma base mais do que conveniente para explorar e degustar o tesouro de “grands crus” e “premiers crus” produzidos ao seu redor. A Bourgogne é subdividida oficialmente em cinco áreas produtoras de vinhos que se sucedem num eixo de apenas 230 quilômetros: Côte de Nuits, Côte de Beaune, Côte Chalonnaise, Mâconnais e Chablis (há quem inclua também Beaujolais na conta). Dá para ir parando de cidadezinha em cidadezinha para admirar os vinhedos, a arquitetura das casas e, de preferência, degustar alguns vinhos locais. Beaune é uma comuna francesa na região administrativa da Bourgogne-Franche-Comté, no Dèpartement Côte-d’Or. Beaune está localizada a pouco mais de 300 quilômetros da capital Paris, no “centro-leste” da França, bem próximo a fronteira com a Suíça. Estende-se por uma área de 31,31 quilômetros quadrados. É a segunda comuna mais populosa do Dèpartment Côte d’Or.

Chegando em Beaune
Apesar de ser uma das regiões vinificas mais importantes da Europa, sua produção representa apenas 0,4% do total mundial; uma a cada duas garrafas é exportada. As características do solo, as condições de temperatura, chuva e insolação e os métodos tradicionais de fabricação extraem das uvas pinot noir e chardonnay o terroir inimitável dos tintos e brancos bourguignons. Todos os caminhos na Bourgogne levam ao encontro da boa comida, dos bons vinhos e dos cenários apaixonantes. Existe mais de quatro mil Domaines (como são chamadas as propriedades vinícolas da Borgonha) na região. Domaine Romanée-Conti, Domaine Leflaive, Domaine Armand Rousseau Père et Fils e Domaine Leroy, são exemplos dentre as mais importantes vinícolas da Côte d’Or, sendo a primeira responsável por produzir o vinho mais caro do mundo (segundo listagem do Wine Searcher). Por razões óbvias, algumas Domaines – como é o caso da Romanée-Conti – não estão (normalmente) abertas à visitação, mas existem centenas – talvez milhares – delas disponíveis para que você possa degustar e ver de pertinho o processo de produção dos vinhos da Borgonha.

As ruas charmosas de Beaune
Beaune funciona muito bem como uma parada entre Paris e Lyon, um dos grandes centros gastronômicos da Europa. Logisticamente falando, Beaune é uma base perfeita para quem pretende viajar pelo interior da França de carro – quase no meio do caminho entre Paris e a Provence. Turisticamente falando, é a cidade perfeita para quem quer conhecer um pouquinho da vida e rotina no verdadeiro interior da França. Ruelas de pedras, edifícios centenários, uma pracinha com carrossel, balões no céu e campos verdes a perder de vista. Uma característica forte de Beaune é a ausência de ventos fortes. Venta muito pouco na região, no verão isso faz com que a sensação de calor seja ainda mais cruel, mas por outro lado faz dali o lugar ideal para passeios de balão. Não é nada raro vê-los no céu de Beaune. Em Beaune, muitas opções de lazer têm estreita ligação com o vinho: passeios (inclusive de bicicleta) através de vinhedos, ótimos restaurantes nos quais é concedida especial atenção à harmonização de vinhos com pratos primorosos, e belos museus.

Musée Du Vin
Basicamente você pode chegar até lá de três maneiras, sempre a partir de Dijon: pedalando, alugando um carro ou vindo de trem. Saindo de Dijon, o melhor caminho é a Route des Grands Crus (também chamados de "Champs Elysées" da Bourgogne), que passa por 33 pequenos vilarejos e inúmeros vinhedos. Viajando de carro, não se esqueça de configurar o GPS para percorrer as estradas menores e fugir das rodovias (eu sempre faço isso). Assim, você conseguirá cruzar com o Château Du Clos de Vougeot rodeado de parreiras no meio do caminho. O Château foi inicialmente construído por monges como uma abadia no século XII e, no século XVI, um grande castelo renascentista foi concluído em seu anexo. São 45 quilômetros entre Dijon e Beaune, mas aposto que você vai querer parar a cada novo quilômetro (digo por experiência própria). É uma rota muito fotogênica. Da Estação Central de Dijon partem trens para Beaune diversas vezes ao dia. A viagem leva menos de 30 minutos. Essa opção não permite parar para fotografar.

Place de La Halle
A Estação de Trem fica bem pertinho da entrada da cidade murada. Caminhe em direção à Place de La Halle, a principal Place da cidade. É nessa Place que as quartas e sábados pela manhã acontece uma feirinha de produtos locais. A Place é cercada por lojinhas de comércio local, caves e alguns cafés e restaurantes, além é claro da principal atração da cidade, os Hospices de BeauneMusée de l’Hôtel Dieu. O Centro Antigo de Beaune fica dentro da cidade murada de origem medieval, está localizada no coração da Borgonha, formada por uma série de ruas estreitas e tortuosas com muitas caves de vinhos. As construções antigas com telhados em desenhos geométricos tingidos de amarelo e vermelho são uma característica da cidade. Inicie a visita a Beaune pela Cathèdrale de Notre-Dame. Saindo da Catedral vá até o prédio do antigo Hotel dos Duques de Beaune, com fachada em estilo flamboyant, uma fase do estilo gótico, mais rebuscado que o normal. No Hotel dos Duques hoje funciona o Musée Du Vin. Para quem visita a Borgonha, passar no Musée Du Vin é imperdível, pois ali está registrado tudo sobre o assunto, desde a área mais favorável à produção, as ferramentas e equipamentos utilizados na lavoura e na produção dos vinhos, até as características de aroma e sabor de todos os vinhos da região. Há diversos passeios para conhecer os produtores da região. 

Hôtel Dieu
A visita que mais impressiona em Beaune é o fantástico Hôtel Dieu, construído em 1443, um antigo hospital construído para cuidar de pessoas pobres e desamparadas, por um nobre da Borgonha e sua esposa, o casal Nicolas e Guigone Rolin. Era uma forma de aliviar a consciência de um casal bem-afortunado, que conseguiu também atrair a cooperação de diversos artistas para ajudar na decoração do local. Naquela altura, o cenário não era das melhores na França, a chamada Peste Negra havia feito muitas vítimas, o país ainda lutava a Guerra dos 100 anos. A fundação de um hospital de caridade, que atendesse a população carente da região surge como uma esperança para muita gente que, mais do que nunca, necessitava de toda e qualquer ajuda. O Hôtel Dieu, ou Hospices de Beaune, é um dos lugares mais bonitos de se visitar na Bourgogne. Mas calma, não precisa ficar com medo de não te deixarem sair mais de lá, não tem nada a ver com hospício. Hospice neste caso quer dizer simplesmente hospital. Hoje em dia é um lugar super bem conservado e um passeio imperdível. A visita começa pelo pátio interno, de onde se pode contemplar a deslumbrante arquitetura medieval em estilo gótico. O destaque fica por conta do uso de telhas policromadas, que dão um aspecto brilhante aos telhados, em um visual colorido único, super típico dessa região da Borgonha

Salle des Pôvres com as camas enfileiradas

Após o pátio interno, a visita segue pelos salões e alas do antigo hospital, com reproduções fiéis ao estilo da época e que ajudam a contar um pouco da história do lugar. Há uma reprodução da ala onde ficavam as camas dos doentes, além da cozinha e da farmácia onde eram armazenados os medicamentos. Essa parte da visita é bem histórica e o áudio guia ajuda a complementar as informações visuais. A “Salle des Pôvres” ainda conserva os leitos medievais, é possível ver a farmácia, a cozinha, tudo como era na época. Também se pode notar a ausência de banheiros. É impressionante e deixa qualquer um feliz de ficar doente nos dias de hoje. Mas pelo menos era um lugar lindo de morrer. Literalmente. A visita levou no total entre 45 e 60 minutos, mesmo com a gente parando para tirar fotos de quase tudo lá dentro.


Salle des Pôvres do Hôtel Dieu com o Políptico 
representando "O Juízo Final" ao fundo
Após mais de 500 anos de sua fundação, em 1971, o Hôtel-Dieu passou a não mais receber enfermos. Desde então, os atendimentos médicos são realizados em um novo hospital, mais moderno e mais bem equipado para atender as necessidades da população local. O antigo “palácio dos pobres” foi então transformado em museu, aberto à visitação. O edifício onde funcionou o hospital  possui uma arquitetura espetacular. É absolutamente impossível passar pelo Hospices de Beaune sem parar por alguns minutos para admirar todos os detalhes e singularidades da construção. O Palais des Pôvres foi construído inspirado em prédios onde funcionavam hotéis no Norte. Com fachadas góticas, as telhas policromáticas formando padrões geométricos indicam referências à Europa Oriental. Foi construído em estilo flamengo e o que mais chama a atenção na sua estrutura é o telhado, formado por um mosaico de telhas vitrificadas (tuiles vernissées), com cores bastante vivas. As cores lembram a paisagem de outono dos vinhedos. 

Cozinha do Hôtel Dieu
O conjunto forma uma obra única da arquitetura medieval. E o melhor ponto para observar a riqueza do telhado é do pátio interno. Esse tipo de telhado pode ser encontrado em várias cidades da Borgonha, mas é aqui no Hôtel Dieu que se tem o exemplar mais belo. Em seu interior, que se assemelha a uma nave central de igreja, os enfermos eram cuidados por freiras, em leitos dispostos lado a lado, nas laterais. Outro ponto alto é o políptico em óleo sobre tela do século XV representando o “O Juízo Final” de Rogier van der Weyden, que fica na última sala antes da saída da visita. Vale alguns minutos de contemplação. Uma enorme lupa percorre toda extensão do quadro para que se possam observar os detalhes do trabalho. Exposto em duas paredes contíguas, o quadro foi seccionado para que os visitantes possam apreciar simultaneamente, o que originalmente seria a obra fechada e aberta. Quando o Hôtel Dieu funcionava, a obra era exposta na maior parte do tempo em sua face externa (no modo fechado): a pintura mostra Nicolas e Guigone Rolin, ajoelhados em cada canto da obra. A parte interna só era aberta nos fins de semana para que o povo tivesse acesso: Jesus Cristo ao centro; à sua direita, o caminho para o paraíso, e à esquerda, o fogo eterno.

Hôtel Dieu - Hospices de Beaune
A fama do local se espalhou rapidamente e não tardaram a bater às portas do hospital não só os menos favorecidos, mas também nobres e representantes de classes mais remediadas - estes eram recebidos numa espécie de ala de primeira classe. Todo médico, se algum dia tiver a chance, deveria vir conhecer o antigo Hospice de Beaune. É uma aula de planejamento administrativo, sustentabilidade econômica e perseverança, além de ação humanitária. O casal Rolin conseguiu donativos e os meios para manter o hospital funcionando, mesmo depois das suas mortes. Dentre os donativos, o Hôtel Dieu recebeu terras excelentes para a produção de uva e vinhos. Os vinhos “Hospice de Beaune” são famosos e a sua comercialização ajudou a pagar as despesas do hospital.

Corredores da Cave Patriarche
Um dos eventos mais importantes da Bourgogne é o leilão anual de caridade dos vinhos de Beaune, ou a Vente des Vins des Hospices de Beaune. A Vente des Vins des Hospices de Beaune organizada pela Christie’s acontece sempre no último fim de semana de novembro e é concorridíssima! O leilão em si não tem interesse nenhum para quem está passeando. Como se trata de um leilão de caridade, algumas celebridades e empresários franceses fazem lances super altos para contribuir com a causa do Hospital de Beaune. Apesar disso, a imprensa e os especialistas acompanham tudo bem de perto, pois os lances costumam indicar a tendência do valor dos vinhos do ano. Os lances são feitos num salão logo em frente ao Hôtel Dieu, e é possível ver o que está acontecendo pelo lado de fora. Portanto, o interesse da coisa não é o leilão, mas sim os eventos que comemoram o fim da temporada de produção de vinho. Durante dois dias a cidade fica em ritmo de festa regada com “vin, beaucoup de vin!”. As caves se abrem para degustações, as praças são invadidas por barraquinhas com comidas e bebidas, os estacionamentos viram parques de diversões para crianças, e as ruas ficam lotadas de turistas e habitantes locais.

Portão da Cave Patriarche
Beaune recebe o título de “capital dos vinhos da Borgonha” não por acaso. São inúmeras produções vinícolas na região, dentre elas estão alguns dos mais famosos e melhores vinhos da França. Nada mais justo que um museu dedicado a esta arte. O Museu do Vinho da Borgonha é local destinado a contar sobre a história e produção local. Um passeio superinteressante para os enófilos ou para qualquer viajante que nutra curiosidade sobre o tema. Bem no centro de Beaune existe uma maneira de degustar vários vinhos de ótima qualidade. A Cave Patriarche, na Rue Du Collège, é uma das caves mais famosas da região, e propõe uma degustação de 14 vinhos diferentes ao longo da visita dos seus corredores subterrâneos que se contorcem por cinco quilômetros nos subterrâneos da cidade. São milhões de garrafas estocadas nas galerias do século XIII. O mais bacana é que quem manda é você. Na hora que a gente chega e paga a entrada, recebe um “tastevin, que é uma tacinha chata de metal usada na Borgonha para  degustar o vinho. Se quiser ajuda na hora da degustação, ótimo. Se não, ninguém vai te amolar. E o mais importante: apesar da visita começar e terminar numa lojinha, ninguém vai te botar pressão para comprar algo.

Hôtel de Ville
Se você tem pouco tempo na cidade, mas não desiste de conhecer – ainda que rapidamente – todos os seus principais atrativos, o Visiotrain pode ser uma opção bem bacana. Os trenzinhos fazem passeios de 45 minutos de duração, passando pelos mais importantes pontos da cidade. Enquanto aproveitam o passeio, os visitantes podem ouvir mais detalhes sobre a cidade e seus monumentos em áudio guias que contemplam nove idiomas, incluindo o português. Os horários das partidas variam de acordo com os dias da semana. A Place Carnot é a segunda Place mais importante da cidade, conhecida por ostentar um carrossel bem ao centro e pela lojinha Mulot & Petitjean, uma das mais famosas na produção de ‘Pain d’Épices’, uma espécie de bolo/pão de especiarias que é bem típica da região. Outros pontos que merecem destaque são a Rue Notre-Dame e a Place Marey. Na Rue de Lorraine fica localizado o Portão de Entrada da cidade. Logo em seguida fica o ‘Hôtel de Ville’, o imponente edifício da Prefeitura da cidade.

Passeio de Bicicleta nos vinhedos da região
Se você já rodou minimamente pelo interior da Europa sabe o quanto os europeus são entusiastas de festivais. Dos mais diversos tipos: musicais, teatrais, gastronômicos, cinematográficos, o que importa é incentivar e prestigiar a arte e produção. Em Beaune, e em toda a região da Borgonha, não poderia ser diferente. Antes de fechar seu roteiro, vale a pena dar uma olhada atenta na agenda cultural de cidade. Muitas vezes você encontrará joias inesperadas que darão um toque todo especial à sua viagem. Quem viaja para Beaune de junho a setembro, por exemplo, pode aproveitar o Lumières à Beaune. O evento convida os visitantes à um “tour iluminado” pela noite de Beaune. Ao longo do caminho, são realizadas grandes projeções de luzes nas fachadas de sete monumentos da cidade. Um show belíssimo inspirado na história da cidade. Já aqueles que visitam a cidade entre novembro e dezembro podem curtir boa música no Beaune Blues Boogie Festival.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Tour pela França - Dijon

Dijon
Na França, por onde quer que se ande, são notáveis os sinais da imbatível tríade: vinho, gastronomia e esplendor arquitetônico. Não podia ser diferente na região da Borgonha – o coração da França. Dijon é uma comuna francesa na região administrativa da Bourgogne-Franche-Comté, no Dèpartement Côte d’Or. Estende-se por uma área de 40,41 quilômetros quadrados. Dijon fica a 310 quilômetros de Paris e a 200 quilômetros de Genebra e Lyon. É atravessada pelo Canal de Borgonha e seus dois cursos naturais de água: os Rios Ouche e Suzon. Em 2008, ela foi eleita como “Cidade da Arte e da História” pela Commission Nationale des Villes d’Art et d’Histoire. O Centre Historique da cidade foi em 2015 incluído na lista do Patrimônio da Humanidade da UNESCO, integrado no sítio Climats de Bourgogne. Dijon é a capital da Borgonha, uma das regiões mais conhecidas pelo seu vinho. Entre os séculos XIV e XV, a região era tão importante quanto Paris, cidade que certamente inspirou a arquitetura do lugar, que tem até um pequeno Arco do Triunfo, a Porte Guillaume. E foi principalmente nesta época que artistas renomados foram trazidos para cá. A ideia era fazer com que Dijon fosse cada vez mais importante no cenário cultural europeu.

Ruas estreitas no Centre Historique de Dijon
É mundialmente famosa pela mostarda de Dijon. Embora importem a mostarda do Canadá, o sucesso internacional é devido ao fato de como é feita a mostarda em Dijon. A cidade é conhecida também pela produção do Kir (uma mistura de vinho branco e creme de cassis). A cidade é uma das paradas obrigatórias para quem faz a Route des Grands Crus da Borgonha. A proximidade em relação a Beaune e a diversas cidades e vilarejos como Nuits-Saint-George, Vosne-Romanee, Vougeot e Musigny (especializados na produção dos vinhos mais intensos e complexos da Borgonha, em sua maioria tintos da uva pinot noir) torna a localização privilegiada para explorar as belezas dessa região repleta de história, de vinhedos e de construções medievais.

Teatro de Dijon
Os primeiros habitantes de Dijon datam da época do Neolítico. Graças as suas muralhas construídas no século III, Dijon se livrou de invasões bárbaras e sarracenas (no século VIII) e normandas (século IX). Na sua “História dos Francos”, Gregório de Tours descreve a Dijon do século VI como rodeada de uma muralha de 9,5 metros de altura e 4,44 metros de largura, com quatro portas e 33 torres. As escavações arqueológicas identificaram 12 destas torres. A área cobre 11 hectares. A partir do século IX, tornou-se a capital do Ducado de Borgonha. O Ducado ia da atual Borgonha até a Suíça, e da Bélgica até Holanda e Luxemburgo. Por isso em Dijon tudo gira em torno dos Ducs de Bourgogne: Philippe Le Bon, Charles Le Téméraire, Philippe Le Hardi e Jean Sans Peur são nomes que você vai ver para todo lado. Em 1137, Dijon foi completamente destruída por um incêndio. Quando Carlos, o Temerário, Duque de Borgonha, morreu, em 1678, sob o reinado de Louis XIV, que a Borgonha foi anexada ao Reino da França.

Porte Guillaume
Durante o antigo regime, Dijon passa a adotar a viticultura e em 1772 se instala a Universidade de Direito na cidade. A exploração do carvão e do ferro, a ativação do Canal de Borgonha em 1833, a abertura de vias férreas e a instalação de uma base aérea confirmaram a importância da cidade como linha de trânsito durante a Primeira Guerra Mundial. Durante a Segunda Guerra Mundial, Dijon foi ocupada pelos alemães. Dijon é uma das cidades mais bem preservadas da França, escapou praticamente ilesa das grandes guerras e hoje guarda belas obras dos períodos gótico e renascentista. Por isso em Dijon, num perímetro bem pequeno, é possível encontrar em ótimo estado tanto ruelas medievais, daquelas com casas de tijolinho e madeira aparente, herança da época em que Dijon fazia parte da rota comercial de especiarias e tecidos, quanto lindos palacetes (ou Hôtels Particuliers) da Renascença, época em que Dijon era uma das cidades preferidas da burguesia endinheirada. A cidade possui mais de 100 edifícios construídos pelas famílias burguesas e pelos parlamentares do século XV até a Revolução.

Place de La Liberté
Apesar de ser considerada uma cidade grande para os padrões da Bourgogne, a capital administrativa da região conserva ares de uma mini Paris (com uma ou outra fachada germânica) e funciona como a porta de entrada para a Rota dos Vinhos. A cidade capital dos duques herdou daquela época a reputação de ser uma rica cidade burguesa. Apesar de achar que é preciso pelo menos dois dias para visitar Dijon corretamente, um bate e volta já dá um passeio legal e é muito fácil. De TGV, o trem rápido francês, o trajeto dura menos de duas horas e sai da Gare du Lyon em Paris. Não compensa ir a Dijon de carro, a não ser que você esteja fazendo um circuito e não um bate e volta. De carro é preciso contar mais de três horas de viagem de Paris, o que deixa o dia bem puxado. Sem falar que o carro vai ser mais um estorvo do que uma utilidade; a única coisa que você vai fazer com seu carro é estacionar (com dificuldade) e deixar encostado o dia todo. Nem pense em circular de carro em Dijon, por enquanto é a pior ideia do mundo. As ruelas são pequenas, as vagas de estacionamento são raras e caras.

Palais des Ducs et des États de Bourgogne 
e a Tour Phillipe Le Bon
Dijon é um dos mais belos exemplares de cidades do interior da França que ainda não foram completamente invadidas pelos turistas, e justamente por isso propiciam uma experiência de passeio bem mais autêntica. Saindo da Estação de Trem e andando dois quarteirões já se chega ao emaranhado de preciosas ruelas deixadas pelos Duques de Borgonha e aos elegantes Hôtels Particuliers construídos nos séculos XVII e XVIII. A cidade conserva importantes obras de arte. Depois de Paris, é um dos centros culturais mais importantes do país. Existem na cidade a Igreja de Saint Philibert, de estilo românico, a Cathèdrale de Notre-Dame (do século XIII), uma das obras mais importantes do estilo gótico, a Igreja de Saint Michel (renascentista), e a Cathèdrale de Saint Bénigne (séculos XIII e XIV), cuja cripta é do século XI. Entre as inumeráveis casas e edifícios de caráter civil que se conservam, destacam o Palais de Justice e o Palais de Ducs et des États de Bourgogne, atualmente Prefeitura e Museu de Belas Artes. Existe um cuidado grande de parques e jardins, sendo considerada por eles mesmos como cidade das quatro flores.

Igreja de Saint Michel
Para escolher o que você deseja visitar, vá ao Office de Tourisme ao lado da Estação de Trem, ou na Rue des Forges, uma das principais, bem no centro da cidade. Lá eles têm um mapinha com o roteiro para você seguir. Ele existe em português do Brasil, coisa rara na França. O legal é que você pode fazer tudo caminhando e sem guia. Continue pela Avenue Foch, o Centre Historique fica a cinco minutos da Estação de Trem. Comece seu passeio com o Percurso da Coruja (Parcours de La Chouette). O Percurso do Coruja é uma sugestão de percurso a ser feito a pé pelo centro de Dijon passando pelos 22 principais pontos turísticos e referências históricas da cidade. São 22 pontos marcados no chão com o desenho de uma pequena coruja. A ideia é que seguindo esse caminho você conheça o básico da cidade e termine a sua visita justamente na Coruja. O nome se deu por conta de uma rocha em formato de coruja que foi encontrada em uma parede na Cathèdrale de Notre-Dame, bem no centro. Dizem que se você a tocar com a mão esquerda, trará sorte para a sua vida. Não custa nada tentar né? E não é que a corujinha acabou virando símbolo da cidade? Em todas as lojinhas você irá encontrar uma para dar de presente. 

Igreja de Saint Michel ao fundo 
e à direita Igreja de Saint Etienne
A duração do percurso vai depender de você. Todos os pontos são gratuitos, menos algumas possíveis exposições temporárias. É só seguir as placas douradas com o desenho da coruja. Bem fácil. Siga passando pelo Jardin Darcy até chegar a Porte Guillaume, o Mini Arco do Triunfo de Dijon, construído no século XVII e fica na entrada oeste da cidade. O Jardin Darcy, construído pelo engenheiro Henri Darcy, é um lindo parque bem pertinho da Estação de Trem de Dijon. Leve comida e faça um piquenique por lá. O urso que você vai ver lá é uma réplica do que está no Museu d’Orsay em Paris, de François Pompom. Criado em 1880 é o primeiro jardim público da cidade, construído em volta do reservatório de água.

Cathèdrale Notre-Dame de Dijon
A rua que começa na Porte Guillaume, a Rue de La Liberté, é uma das principais ruas de Dijon, e a mais movimentada. Ela não está no percurso, mas não deixe de passar por ela. Na Rue de La Liberté – acessível apenas para pedestres – ficam lojas ótimas, como a Galeries Lafayette, H&M e a Boutique Maille, que vende uma quantidade enorme de mostardas diferentes (existe uma réplica desta loja em Paris, na Madeleine), aromatizadas até com caviar. Você pode degustar vários tipos e escolher a sua, é uma ótima ideia de presente. Aproveite que você estará bem pertinho e siga até o Palais de Ducs et des États de Bourgogne. É o ponto alto da cidade, uma antiga fortaleza que passou por várias reconstruções e por isso mistura diferentes estilos arquitetônicos. O prédio foi construído para abrigar o Parlamento no século XVII e hoje mantém o Musée des Beaux-Arts e a administração municipal. Dijon tem oito museus com temas diferentes, o que é excepcional para uma cidade desse tamanho. 

Place Wilson
Como num dia só não dá para ver todos, escolha o mais legal, que é o Musée des Beaux-Arts, que fica no Palais des Ducs et des Etats de Bourgogne. Esse realmente é imperdível. Além de a coleção ser superinteressante (com obras que contam um pouco da história da região, aqui você encontrará também uma coleção modesta de obras modernas, como Monet e Rodin), o Museu é lindo, pois fica num Palácio, assim como o Louvre. O destaque fica para a Salle des Gardes, onde se encontram os túmulos dos Ducs de Bourgogne. O melhor disso tudo? Todos os museus de Dijon (exceto o Musée Magnin) são gratuitos. Se você conseguir, faça também uma visita guiada ao local, assim você terá acesso a áreas que não poderia ir sozinho. 

Place Wilson
Ainda no Palais des Ducs é possível subir na Tour Philippe Le Bon. As subidas são organizadas a cada 45 minutos e são pagas. A subida deve ser obrigatoriamente feita com guia e reservada. Vai ser preciso um pouco de fôlego para subir a pé os 316 degraus que levam ao topo, mas a vista compensa. Durante a subida, o guia faz algumas breves pausas para contar um pouco da história da Torre e da cidade como um todo. O interessante é procurar pelos telhados coloridos típicos da Borgonha, feitos de telhas vitrificadas. É uma ótima ideia ver a cidade por outra perspectiva. Embora a Torre não seja tão alta, ela tem apenas 46 metros, já dá para ter uma ideia da região, inclusive de ver como os vinhedos estão próximos. A Torre foi construída no século XV, a pedido do Duque de Borgonha, Felipe, o Bom (sim, ele se autointitulou como “O Bom”) para mostrar ao povo sua importância e riqueza. Dizem que quando o tempo está limpo dá para ver até o famoso Mont Blanc.

Jardin Darcy
O ponto alto do roteiro é a visita à Cathèdrale de Notre-Dame, uma igreja do século XIII. Mais antiga que a Cathèdrale Notre-Dame de Paris, sua fachada chama muito a atenção pelo forte simbolismo gótico do século XIII com as tradicionais gárgulas da época (mais de 50) em sua fachada, representando homens, monstros e animais. No teto da Notre-Dame se encontra o famoso Relógio Jacquemart. Ele possui dois bonecos metálicos, Jacquemart e Jacqueline, que tocam as horas com um martelo. Os personagens menores, os filhos, tocam com seus sininhos. Também vale conferir a Igreja de Saint Michel que mistura os estilos gótico e renascentista. O Hotel Aubriot com suas coloridas telhas vitrificadas, além é claro de caminhar pelas ruazinhas estreitas com casas antigas e charmosas que deixam o madeirame à vista. 

Jardin Darcy

Musée des Beaux-Arts
Uma parada essencial em Dijon é no Marché des Halles, espaço que já abrigou um antigo monastério do século XIV e foi projetado sobre suas ruínas por Gustave Eiffel, o próprio, que nasceu na cidade. A construção foi inspirada nos grandes mercados centrais de Paris, com telhados de vidro, que permitem a entrada de luz natural. Abriga cerca de 246 lojas com os melhores produtos nacionais. Lá é possível encontrar ótimos produtos, em especial o “jambon persillé”, ou presunto com uma espécie de gelatina de salsinha, uma especialidade da Bourgogne. Mesmo sem comprar nada, vale o passeio. Mas vá logo cedo, pois o Mercado só funciona de manhã, e na quinta apenas algumas barracas estão abertas. Alguns dias têm também uma feirinha de antiguidades nas ruas vizinhas, principalmente perto da Place Grangier e da Place François Rude. Dijon é sem dúvida o reduto dos gourmets. Em cada canto da cidade, é possível observar essa relação com a quantidade de boulangeries, pâtisseries, restaurantes e bistrôs, lojas de vinhos e casas especializadas em produtos e comidas típicas, que afirmam o que eles denominam a “Art de Vivre” francesa. 

Restaurant Au Moulin À Vent
Ao redor do Mercado você encontrará vários bistrôs charmosos e com menus do dia com preços acessíveis e cardápios repletos dos clássicos da região preparados com produtos fresquíssimos. Nos seus arredores, vários restaurantes e bares convidam a uma paradinha para o deleite com a gastronomia local, que inclui escargots, trutas, queijos e a conhecida mostarda Dijon. Não vá embora antes de conhecer as boutiques das tradicionais mostardas de Dijon (que não são mais de Dijon). São paradas obrigatórias as visitas à Moutarderie Edmond Fallot, com suas inúmeras variações de mostarda, que levam na receita desde cassis até trufas. Lá você poderá provar diferentes combinações conhecer mais sobre a história e o processo de fabricação dessa iguaria. Difícil resistir. Outro clássico de Dijon é o “pain d’épices”, uma espécie de pão de mel com especiarias. 

Um dos inúmeros restaurantes de Dijon
É possível fazer de Dijon a sua base para explorar a região, mas muitos preferem hospedar em Beaune, a capital dos vinhos, ou em alguns dos vilarejos da Côte d’Or. Dijon é uma cidade linda, mas pequena. Então evite ir no domingo, pois quase tudo vai estar fechado, como na maioria das cidades de pequeno e médio porte na França que não vivem exclusivamente do turismo. Segunda-feira de manhã muitos comércios também fecham, mas abrem à tarde, então não atrapalha muito. Terça-feira é um dia a ser evitado para quem gosta de museus, pois é o dia em que todos estão fechados. Outra opção é fazer algum passeio dedicado aos vinhos da região. No Office de Tourisme da cidade tem saídas regulares de passeios de um dia inteiro e também de meio período. Para quem gosta de pedalar, passeios de bicicleta pela Borgonha são oferecidos na cidade, com um percurso de pequena dificuldade. O programa inclui um roteiro de 15 quilômetros pela estonteante região.