Dijon |
Na França, por onde quer que se ande, são notáveis os sinais da
imbatível tríade: vinho, gastronomia e esplendor arquitetônico. Não podia ser
diferente na região da Borgonha – o
coração da França. Dijon é uma comuna francesa na região
administrativa da Bourgogne-Franche-Comté,
no Dèpartement Côte d’Or. Estende-se
por uma área de 40,41 quilômetros quadrados. Dijon fica a 310 quilômetros de Paris e a 200 quilômetros de Genebra e Lyon. É atravessada pelo Canal de Borgonha e seus dois cursos naturais
de água: os Rios Ouche e Suzon. Em 2008, ela foi eleita como “Cidade da Arte e da História” pela Commission Nationale des Villes d’Art et
d’Histoire. O Centre Historique
da cidade foi em 2015 incluído na lista do Patrimônio
da Humanidade da UNESCO, integrado no sítio Climats de Bourgogne. Dijon é a capital da Borgonha, uma das regiões mais
conhecidas pelo seu vinho. Entre os séculos XIV e XV, a região era tão
importante quanto Paris, cidade que
certamente inspirou a arquitetura do lugar, que tem até um pequeno Arco do Triunfo, a Porte Guillaume. E foi principalmente nesta época que artistas
renomados foram trazidos para cá. A ideia era fazer com que Dijon fosse cada vez mais importante no
cenário cultural europeu.
Ruas estreitas no Centre Historique de Dijon |
É mundialmente famosa pela
mostarda de Dijon. Embora importem a
mostarda do Canadá, o sucesso internacional é devido ao fato de como é feita a
mostarda em Dijon. A cidade é
conhecida também pela produção do Kir
(uma mistura de vinho branco e creme de cassis). A cidade é uma das paradas
obrigatórias para quem faz a Route des
Grands Crus da Borgonha. A proximidade em relação a Beaune e a diversas cidades e vilarejos como Nuits-Saint-George, Vosne-Romanee,
Vougeot e Musigny (especializados na produção dos vinhos mais intensos e
complexos da Borgonha, em sua
maioria tintos da uva pinot noir) torna a localização privilegiada para
explorar as belezas dessa região repleta de história, de vinhedos e de
construções medievais.
Teatro de Dijon |
Os primeiros habitantes
de Dijon datam da época do Neolítico. Graças as suas muralhas
construídas no século III, Dijon se
livrou de invasões bárbaras e sarracenas (no século VIII) e normandas (século
IX). Na sua “História dos Francos”,
Gregório de Tours descreve a Dijon
do século VI como rodeada de uma muralha de 9,5 metros de altura e 4,44 metros
de largura, com quatro portas e 33 torres. As escavações arqueológicas
identificaram 12 destas torres. A área cobre 11 hectares. A
partir do século IX, tornou-se a capital do Ducado de Borgonha. O Ducado ia da atual Borgonha até a Suíça, e
da Bélgica até Holanda e Luxemburgo.
Por isso em Dijon tudo gira em torno
dos Ducs de Bourgogne: Philippe Le Bon, Charles Le Téméraire, Philippe Le Hardi e Jean Sans
Peur são nomes que você vai ver para todo lado. Em 1137, Dijon foi completamente destruída
por um incêndio. Quando Carlos, o Temerário, Duque de Borgonha, morreu, em 1678, sob o
reinado de Louis XIV, que a Borgonha
foi anexada ao Reino da França.
Porte Guillaume |
Durante o antigo regime,
Dijon passa a adotar a viticultura e
em 1772 se instala a Universidade de Direito
na cidade. A exploração do carvão e do ferro, a ativação do Canal de Borgonha em 1833, a abertura
de vias férreas e a instalação de uma base aérea confirmaram a importância da
cidade como linha de trânsito durante a Primeira Guerra Mundial. Durante a Segunda
Guerra Mundial, Dijon foi
ocupada pelos alemães. Dijon é uma
das cidades mais bem preservadas da França,
escapou praticamente ilesa das grandes guerras e hoje guarda belas obras dos
períodos gótico e renascentista. Por isso em Dijon, num perímetro bem pequeno, é possível encontrar em ótimo estado tanto ruelas medievais, daquelas com casas de tijolinho e madeira aparente, herança
da época em que Dijon fazia parte da
rota comercial de especiarias e tecidos, quanto lindos palacetes (ou Hôtels Particuliers) da Renascença,
época em que Dijon era uma das
cidades preferidas da burguesia endinheirada. A cidade possui mais de 100 edifícios
construídos pelas famílias burguesas e pelos parlamentares do século XV até a Revolução.
Place de La Liberté |
Apesar de ser considerada uma cidade
grande para os padrões da Bourgogne,
a capital administrativa da região conserva ares de uma mini Paris (com uma ou outra fachada
germânica) e funciona como a porta de entrada para a Rota dos Vinhos. A cidade capital
dos duques herdou daquela época a reputação de ser uma rica cidade burguesa. Apesar de achar que é preciso pelo
menos dois dias para visitar Dijon
corretamente, um bate e volta já dá um passeio legal e é muito fácil. De TGV, o trem rápido francês, o trajeto
dura menos de duas horas e sai da Gare
du Lyon em Paris. Não compensa ir a Dijon de carro, a não ser que você esteja fazendo um circuito
e não um bate e volta. De carro é preciso contar mais de três horas de viagem
de Paris, o que deixa o dia bem
puxado. Sem falar que o carro vai ser mais um estorvo
do que uma utilidade; a única coisa que você vai fazer com seu carro é
estacionar (com dificuldade) e deixar encostado o dia todo. Nem pense em circular de carro em Dijon, por enquanto é a pior ideia do mundo. As ruelas são
pequenas, as vagas de estacionamento são raras e caras.
Palais des Ducs et des États de Bourgogne e a Tour Phillipe Le Bon |
Dijon é um dos mais
belos exemplares de cidades do interior da França que ainda não foram completamente invadidas
pelos turistas, e justamente por isso
propiciam uma experiência de passeio bem mais autêntica. Saindo da Estação de Trem e andando dois
quarteirões já se chega ao emaranhado de preciosas ruelas deixadas pelos Duques de Borgonha e aos elegantes Hôtels Particuliers
construídos nos séculos XVII e XVIII. A cidade conserva
importantes obras de arte. Depois de Paris, é um dos centros culturais mais
importantes do país. Existem na cidade a Igreja de Saint Philibert, de estilo românico, a Cathèdrale de Notre-Dame
(do século XIII), uma das obras mais importantes do estilo gótico, a Igreja de Saint Michel (renascentista),
e a Cathèdrale de Saint Bénigne (séculos XIII e XIV), cuja cripta é do
século XI. Entre as inumeráveis casas e edifícios de caráter civil que se conservam,
destacam o Palais de Justice e o Palais de
Ducs et des États de Bourgogne, atualmente Prefeitura e Museu de Belas
Artes. Existe um cuidado grande de parques e jardins, sendo considerada por
eles mesmos como cidade das quatro flores.
Igreja de Saint Michel |
Para escolher o que
você deseja visitar, vá ao Office de
Tourisme ao lado da Estação de Trem,
ou na Rue des Forges, uma das
principais, bem no centro da cidade. Lá eles têm um mapinha com o roteiro para
você seguir. Ele existe em português do Brasil,
coisa rara na França. O legal é que você pode fazer tudo caminhando e sem guia. Continue
pela Avenue Foch, o Centre Historique fica a cinco minutos
da Estação de Trem. Comece seu
passeio com o Percurso da Coruja (Parcours de La Chouette). O Percurso do Coruja é uma sugestão de
percurso a ser feito a pé pelo centro de Dijon
passando pelos 22 principais pontos turísticos e referências históricas da
cidade. São 22 pontos marcados no chão com o desenho de uma pequena coruja. A ideia é que seguindo esse caminho você
conheça o básico da cidade e termine a sua visita justamente na Coruja. O
nome se deu por conta de uma rocha em formato de coruja que foi encontrada em
uma parede na Cathèdrale de Notre-Dame,
bem no centro. Dizem que se você a tocar com a mão esquerda, trará sorte para a
sua vida. Não custa nada tentar né? E não é que a corujinha acabou virando
símbolo da cidade? Em todas as lojinhas você irá encontrar uma para dar de
presente.
Igreja de Saint Michel ao fundo e à direita Igreja de Saint Etienne |
A duração do percurso
vai depender de você. Todos os pontos são gratuitos, menos algumas possíveis
exposições temporárias. É só seguir as placas douradas com o desenho da coruja.
Bem fácil. Siga passando pelo Jardin
Darcy até chegar a Porte Guillaume,
o Mini Arco do Triunfo de Dijon,
construído no século XVII e fica na entrada oeste da cidade. O Jardin Darcy, construído pelo engenheiro
Henri Darcy, é um lindo parque bem pertinho da Estação de Trem de Dijon. Leve comida e faça um piquenique por lá.
O urso que você vai ver lá é uma réplica do que está no Museu d’Orsay em Paris,
de François Pompom. Criado em 1880 é o primeiro jardim público da cidade,
construído em volta do reservatório de água.
Cathèdrale Notre-Dame de Dijon |
A rua que começa na Porte Guillaume, a Rue de La Liberté, é uma das principais ruas de Dijon, e a mais movimentada. Ela não
está no percurso, mas não deixe de passar por ela. Na Rue de La Liberté – acessível apenas para pedestres – ficam lojas ótimas,
como a Galeries Lafayette, H&M e a Boutique Maille, que vende uma quantidade enorme de mostardas
diferentes (existe uma réplica desta loja em Paris, na Madeleine),
aromatizadas até com caviar. Você
pode degustar vários tipos e escolher a sua, é uma ótima ideia de presente. Aproveite
que você estará bem pertinho e siga até o Palais
de Ducs et des États de Bourgogne. É o ponto alto da cidade, uma antiga
fortaleza que passou por várias reconstruções e por isso mistura diferentes
estilos arquitetônicos. O prédio foi construído para abrigar o Parlamento no
século XVII e hoje mantém o Musée des
Beaux-Arts e a administração municipal. Dijon tem oito museus com temas diferentes, o que é excepcional para
uma cidade desse tamanho.
Place Wilson |
Como num dia só não dá
para ver todos, escolha o mais legal, que é o Musée des Beaux-Arts, que fica no Palais des Ducs et des Etats de Bourgogne.
Esse realmente é imperdível. Além de a coleção ser superinteressante (com obras
que contam um pouco da história da região, aqui você encontrará também uma
coleção modesta de obras modernas, como Monet e Rodin), o Museu é lindo, pois
fica num Palácio, assim como o Louvre.
O destaque fica para a Salle des Gardes,
onde se encontram os túmulos dos Ducs de
Bourgogne. O melhor disso tudo? Todos os museus de Dijon (exceto o Musée
Magnin) são gratuitos. Se
você conseguir, faça também uma visita guiada ao local, assim você terá acesso
a áreas que não poderia ir sozinho.
Place Wilson |
Ainda no Palais des Ducs é possível subir na Tour
Philippe Le Bon. As subidas são organizadas a cada 45 minutos e
são pagas. A subida deve ser obrigatoriamente feita com guia e reservada. Vai
ser preciso um pouco de fôlego para subir a pé os 316 degraus que levam ao
topo, mas a vista compensa. Durante a subida, o guia faz algumas breves pausas
para contar um pouco da história da Torre e da cidade como um todo. O
interessante é procurar pelos telhados coloridos típicos da Borgonha, feitos de telhas vitrificadas.
É uma ótima ideia ver a cidade por outra perspectiva. Embora a Torre não seja
tão alta, ela tem apenas 46 metros, já dá para ter uma ideia da região,
inclusive de ver como os vinhedos estão próximos. A Torre foi construída no
século XV, a pedido do Duque de Borgonha,
Felipe, o Bom (sim, ele se autointitulou como “O Bom”) para mostrar ao povo sua importância e riqueza. Dizem que
quando o tempo está limpo dá para ver até o famoso Mont Blanc.
Jardin Darcy |
O ponto alto do roteiro
é a visita à Cathèdrale de Notre-Dame,
uma igreja do século XIII. Mais antiga que a Cathèdrale Notre-Dame de Paris, sua fachada chama muito a atenção
pelo forte simbolismo gótico do século XIII com as tradicionais gárgulas da
época (mais de 50) em sua fachada, representando homens, monstros e animais. No
teto da Notre-Dame se encontra o famoso
Relógio Jacquemart. Ele possui dois bonecos
metálicos, Jacquemart e Jacqueline, que tocam as horas com um martelo. Os personagens
menores, os filhos, tocam com seus sininhos. Também vale conferir a Igreja de Saint Michel que mistura os
estilos gótico e renascentista. O Hotel
Aubriot com suas coloridas telhas vitrificadas, além é claro de caminhar
pelas ruazinhas estreitas com casas antigas e charmosas que deixam o madeirame
à vista.
Jardin Darcy |
Musée des Beaux-Arts |
Uma parada essencial em
Dijon é no Marché des Halles, espaço que já abrigou um antigo monastério do
século XIV e foi projetado sobre suas ruínas por Gustave Eiffel, o próprio, que
nasceu na cidade. A construção foi inspirada nos grandes mercados centrais de
Paris, com telhados de vidro, que permitem a entrada de luz natural. Abriga
cerca de 246 lojas com os melhores produtos nacionais. Lá é possível encontrar
ótimos produtos, em especial o “jambon
persillé”, ou presunto com uma espécie de
gelatina de salsinha, uma especialidade da Bourgogne.
Mesmo sem comprar nada, vale o passeio. Mas vá logo cedo, pois o Mercado
só funciona de manhã, e na quinta apenas
algumas barracas estão abertas. Alguns dias têm também uma feirinha de antiguidades nas ruas vizinhas, principalmente perto da Place Grangier e da Place François Rude. Dijon é sem dúvida o reduto dos gourmets. Em cada canto da cidade,
é possível observar essa relação com a quantidade de boulangeries, pâtisseries,
restaurantes e bistrôs, lojas de vinhos e casas especializadas em produtos e
comidas típicas, que afirmam o que eles denominam a “Art
de Vivre”
francesa.
Restaurant Au Moulin À Vent |
Ao redor do Mercado
você encontrará vários bistrôs charmosos e com menus do dia com preços
acessíveis e cardápios repletos dos clássicos da região preparados com produtos
fresquíssimos. Nos seus arredores, vários restaurantes e bares convidam a uma
paradinha para o deleite com a gastronomia local, que inclui escargots, trutas, queijos e a conhecida
mostarda Dijon. Não vá embora antes
de conhecer as boutiques das tradicionais mostardas de Dijon (que não são mais de Dijon).
São paradas obrigatórias as
visitas à Moutarderie Edmond Fallot,
com suas inúmeras variações de mostarda, que levam na receita desde cassis até
trufas. Lá você poderá provar diferentes
combinações conhecer mais sobre a história e o processo de fabricação dessa
iguaria. Difícil resistir. Outro clássico de Dijon é o “pain d’épices”,
uma espécie de pão de mel com especiarias.
Um dos inúmeros restaurantes de Dijon |
É possível fazer de Dijon a sua base para explorar a
região, mas muitos preferem hospedar em Beaune,
a capital dos vinhos, ou em alguns dos vilarejos da Côte d’Or. Dijon é uma
cidade linda, mas pequena. Então evite ir no domingo, pois quase tudo vai estar fechado,
como na maioria das cidades de pequeno e médio porte na França que não vivem exclusivamente do turismo. Segunda-feira de
manhã muitos comércios também fecham, mas abrem à tarde, então não atrapalha
muito. Terça-feira é um dia a ser evitado para quem gosta de museus, pois é o
dia em que todos estão fechados. Outra opção é fazer algum passeio dedicado aos
vinhos da região. No Office de Tourisme
da cidade tem saídas regulares de passeios de um dia inteiro e também de meio
período. Para quem gosta de pedalar, passeios de bicicleta pela Borgonha são oferecidos na cidade, com
um percurso de pequena dificuldade. O programa inclui um roteiro de 15
quilômetros pela estonteante região.
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