sábado, 26 de março de 2016

Rio Grande do Sul - Torres

Torres
Famoso pela Serra Gaúcha, pela região das Missões Jesuíticas e pelos Cânions Fortaleza e Itaimbezinho, o Rio Grande do Sul nunca foi muito aclamado por seu litoral. De fato, a concorrência com os oito mil quilômetros de costa do Brasil coloca o Estado numa razoável desvantagem. O gaúcho não precisa ir muito longe para encontrar praias incríveis em Santa Catarina. Mas o que pouca gente fora do Sul sabe é que Torres, no litoral norte do Rio Grande do Sul, concentra algumas das mais belas praias do Estado – e fazem frente às mais belas do país. Acessível por uma ótima estrada, Torres fica a 197 quilômetros de Porto Alegre. Recebe anualmente milhares de turistas de todo o Brasil e países vizinhos. É um polo de veraneio de muitos gaúchos e o Rio Mampituba, que corta a cidade, marca a divisa com Santa Catarina. A cidade em si não tem nada de excepcional. Segue aquele aspecto de balneários brasileiros, com casas simples, sorveterias, lojas de boias e outras emergências litorâneas e aquele aspecto leve e descompromissado dos trópicos. É possível encontrar mar, ilhas, praias, dunas, rochedos, Mata Atlântica, rio, lagoas, cachoeira, fauna e flora variadas. O que tem de único no litoral de Torres são as suas praias – principalmente a da Guarita e a Prainha. De brinde, formações de falésias sem igual no Brasil, bons museus, visita aos lobos-marinhos na Ilha dos Lobos e o principal festival de balonismo da América do Sul.

Praia da Guarita
Cartão-postal principal de Torres, a Praia da Guarita é merecidamente considerada a mais bela do Estado, é um resumo perfeito dos encantos da região. Fica dentro do parque que recebe o mesmo nome, uma zona de proteção onde é cobrada entrada apenas para carros. Uma rede de trilhas fáceis, bem estruturadas e sinalizadas leva a um complexo único de enseadas e penhascos. É tudo muito verde e diferente do resto da costa brasileira. As águas ali são claras, em um tom raramente encontrado no litoral gaúcho, e podem receber ondulações fortes. Apesar de protegida pelas Torres do Meio e do Sul, o mar é agitado e somente os surfistas o enfrentam. Nas areias, porém, o clima é de tranquilidade, com pouquíssimas barracas. Você não terá visto tudo se não subir à Torre Sul, que oferece o melhor ângulo da Praia. Os cerca de 100 degraus podem desmotivar, mas a vista lá de cima compensará o sacrifício, onde se tem uma bela vista da Praia da Guarita, Praia de Itapeva, Torre do Meio, dunas e da cidade. A Torre do Meio, também conhecida como Morro das Furnas, fica entre a Praia da Guarita e a Praia da Cal, é enorme, tem 800 metros de extensão, e a trilha que atravessa o platô, é uma ótima opção de caminhada. Há alguns pontos onde é possível descer pelas escadarias e visualizar as furnas, onde o mar entra em cavernas por baixo dos penhascos. Cuidado! Algumas escadas são bastante íngremes e com a maré alta é perigoso ir a alguns locais, pois o mar é muito forte. 

Praia da Cal
Andando para o norte, uma trilha asfaltada e com boas escadas leva à Praia das Torres. Penhascos majestosos demandam cliques com muito cuidado para não chegar perto demais do limite de segurança. Uma paisagem dramática, que lembra as falésias da Irlanda. Você entenderá logo a razão do nome da cidade ao observar as lindas formações basálticas. Não tenha pressa: busque seu cantinho para admirar tanta beleza. Lá de cima também é possível avistar a Praia da Cal e, adiante, a Prainha. Na Prainha, a tranquilidade também impera. O que muda é a paisagem, formada por uma larga faixa de grama onde as famílias esticam cangas e toalhas. Pais e filhos marcam presença, ainda, na bonita Praia da Cal, contornada por casas de veraneio e calçadão. Depois da Guarita você terá dificuldade em escolher qual a segunda mais bonita de Torres. Os surfistas adoram a Cal, mas principalmente a Praia dos Molhes, onde estão algumas das melhores ondas do litoral gaúcho. A melhor época para surfe é de março a agosto, mas em julho os surfistas (e quem mais estiver na areia) podem ver bandos de golfinhos que passeiam por lá atrás das tainhas. É sempre importante tomar cuidado com as redes dos pescadores – eles, afinal, também estão em busca dos peixes.

Praia da Guarita
Já quem procura animação segue para a Praia Grande, que na alta temporada fica tomada de guarda-sóis. Os bares, restaurantes e pousadas nos arredores garantem o movimento constante. Próxima do centro reúne famílias e grupos de jovens e adolescentes. Outro cenário de paz absoluta é a Praia de Itapeva, sem quiosques ou ambulantes. O mar é calminho e as areias são perfeitas para praticar esportes como caminhada, corrida e frescobol. Para os preguiçosos, uma boa notícia: muita gente estaciona o carro na areia. Na hora de apreciar a boa mesa, todos os caminhos levam à margem do Rio Mampituba. Lá estão os melhores restaurantes de pescados da região, além de muitas churrascarias. Torres vive essencialmente em torno do turismo que sua bela paisagem natural e suas praias de banho favorecem.

Praia da Cal vista do Morro do Farol
Além das belas praias, Torres surpreende por outro título: o de “capital brasileira do balonismo”. Entre abril e maio, o céu fica supercolorido com o Festival Internacional de Balonismo de Torres, que ocorre anualmente, e agrada aos praticantes pelo seu clima e topografia ideais para o voo e por oferecer uma das melhores infraestruturas do Brasil para pilotos e equipes. As provas são diversas e incluem modalidades como velocidade e precisão. Vale a pena se programar para ir nessa época – é mágico vê-los voando ao mesmo tempo, emoldurados pelas formações rochosas da Praia da Guarita. O evento mobiliza a cidade não apenas com os balões, mas também com muitos shows. Na época do Festival é possível ainda embarcar em voos de balão, geralmente ao amanhecer e entardecer. Os preços variam e são negociados diretamente com os pilotos. O preço dá direito a brinde de espumante da Serra Gaúcha no fim – e a taça você pode levar para casa como recordação. A boa notícia é que, mesmo que não vá à época do Festival, os passeios operam o ano todo (embora dependam, logicamente, das condições climáticas). Outro jeito de ver Torres do alto é de parapente ou paramotor.

Torres vista dos Molhes do Rio Mampituba
A paisagem da cidade se destaca por ser a única praia do Rio Grande do Sul em que sobressaem paredões rochosos à beira-mar, e por ter à sua frente a única ilha marítima do Estado, a Ilha dos Lobos, uma reserva ecológica, a menos de dois quilômetros da costa. Durante o verão, as estrelas do litoral gaúcho são os lobos-marinhos. Não há praias e nem é permitido desembarcar, mas contornando as rochas é possível avistar vários grupos descansando por ali. Um barato para crianças e adultos. O passeio é tranquilo e dura cerca de 90 minutos. Entre os meses de março e setembro é possível encontrar baleias francas no litoral de Torres. Em terra, uma parada obrigatória é o Morro do Farol, também conhecido como Torre Norte, pertinho do centro. Se não estiver com muita disposição, dá para subir de carro, mas a caminhada vale a pena. O local é ponto de voos de paraglider. De lá, mais uma bela panorâmica da cidade – dessa vez com o Parque da Guarita incluso no cenário, além da Praia da Cal, Praia Grande e Torre do Meio. A parte de baixo, ao pé do Morro, é um ótimo lugar para fazer uma caminhada, há uma calçada à beira mar que atravessa o Morro e liga uma praia à outra e uma Gruta de Nossa Senhora Aparecida. No centro, a Lagoa do Violão tem boa estrutura para caminhar ou pedalar e é um dos lugares mais buscados para ver o pôr do sol.

Molhes do Rio Mampituba. À esquerda 
Oceano Atlântico, à direita Rio Mampituba
A alta temporada vai de novembro a março, mas Torres têm opções para o ano todo. Claro, estamos no Sul e é comum as temperaturas baixarem e as chuvas caírem forte. Duas boas atrações indoor são os museus da cidade. O Museu Histórico de Torres, bem no centrinho, relembra o passado da cidade por meio de objetos e imagens. É simples, mas bonitinho. Já o Museu Parque da Guarita revela como se deram as formações particulares que dão o charme à região. O único monumento histórico/artístico de grande porte a sobreviver na cidade é a Igreja de São Domingos, erguida entre 1819 e 1824, a primeira Igreja a ser construída no trecho entre Laguna e Osório. É considerada, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do Sul, que a tombou em 1983, o marco inicial da cidade, que se desenvolveu em seu entorno. Tem um estilo colonial luso-brasileiro, embora tenha sofrido algumas intervenções posteriores em diferentes linguagens arquitetônicas. Também resistem a “Casa da Terra”, datada de 1854, e uma casa pegada à Igreja de São Domingos, chamada Casa n˚ 1, que recebeu o Imperador Dom Pedro I em sua passagem pela cidade.

Praia dos Molhes
O local onde está a cidade de Torres foi habitado pelo homem desde milhares de anos atrás, que deixou testemunhos físicos na forma de sambaquis e outros achados arqueológicos. No século XVII, durante a colonização do Brasil pelos portugueses, por estar encravado em um estreitamento da planície costeira sulina, o local passou a se constituir rota de passagem obrigatória para os tropeiros e outros desbravadores e aventureiros luso-brasileiros vindos do norte pelo litoral – a única outra passagem que havia então era por cima do Planalto de Vacaria - e que buscavam os rebanhos livres de gado que se multiplicavam no Pampa mais ao sul e caçavam os indígenas para fazê-los escravos. Muitos acabaram por se fixar na região e se tornaram estancieiros e pequenos agricultores. E por dispor de morros junto à praia, logo foi reconhecido seu valor estratégico como ponto de observação e controle de passagem, de importância militar e política no processo de expansão do território português sobre o espanhol.

Passo Torres
A construção da Igreja de São Domingos no início do século XIX atraiu para seu entorno muitos dos residentes dispersos na região, estruturando-se desta forma um povoado. Sua evolução ao longo deste século, porém, foi morosa, mesmo tendo recebido levas de imigrantes alemães e italianos, sobrevivendo numa economia basicamente de subsistência. A expansão econômica, social e urbana só aconteceu a partir do início do século XX, quando em vista de sua bela paisagem, clima ameno e boas praias de banho, o potencial turístico da cidade foi descoberto e passou a ser explorado. Desde então cresceu com mais vigor e celeridade, chegando hoje a se tornar uma das praias mais procuradas do Estado, recebendo no verão um público flutuante mensal de 200 mil pessoas, muitas delas estrangeiras, vindas principalmente dos países do Prata. Isso contrasta com as dimensões de sua população fixa, que pouco passa dos 30 mil habitantes. Não por isso deixou de desenvolver uma economia consistente e boa infraestrutura para atender a esta demanda turística, sua fonte principal de renda.

Pesca de tarrafa no Rio Mampituba
Torres, um dos antigos núcleos de povoamento do Estado, inicialmente tinha uma arquitetura extremamente pobre, constituída de casebres de barro ou ramos cobertos de palha ou folhas de palmeira. Em seguida começaram a surgir exemplares típicos da arquitetura colonial brasileira, de influência barroca portuguesa, com casas construídas de taipa ou pedra e cobertas com telhas. Quando se iniciou a exploração turística no começo do século XX foram construídos diversos prédios novos, entre hotéis e residências de verão para famílias abastadas de Porto Alegre e do interior do Estado, estas muitas vezes de madeira e com requintes decorativos como lambrequins e balaustradas. Enquanto o turismo trouxe progresso e crescimento, tornando a cidade um polo estadual para eventos, festas, competições esportivas, espetáculos e outras atrações, trouxe também sérios problemas para o meio ambiente e a cultura tradicional. Antes coberta pela Mata Atlântica, ali de biodiversidade especialmente rica pela variedade de ambientes criados pela geografia complexa da área, hoje tem este patrimônio natural severamente ameaçado e muito reduzido, com poucas áreas preservadas, já tendo perdido muitas espécies e estando outras tantas em perigo.

Pescadores no Rio Mampituba
Torres compartilha com toda a região do Litoral Norte do Estado diversos costumes tradicionais, a começar pelos hábitos típicos da comunidade pesqueira, com suas técnicas e materiais antigos, que ainda sobrevivem principalmente entre os pescadores mais velhos, produzindo artesanalmente suas redes e barcos, mantendo seus conhecimentos e interpretações tradicionais sobre o mar, os fenômenos do clima e os peixes, e preservando uma série de práticas como a de fazer promessas e benzeduras antes de sair à pesca, ou usando amuletos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário